A moral está presente em quase todas as decisões. É um conjunto de valores e noções básicas sobre o que é certo ou errado e que ajuda na definição de intenções e ações. A moral regula as relações para que se mantenha uma ordem social. Um dilema moral é experimentado quando, numa situação complexa, dentre vários caminhos possíveis, uma decisão deve ser tomada de imediato, muito embora em outras circunstâncias a mesma decisão pudesse ser contestável. O dilema moral está no hospital, quando duramente é preciso determinar de quem é a prioridade da vaga restante na UTI; na ação policial, com a arma engatilhada e apontada para o possível criminoso; no tribunal, quando a moral se entrelaça com o direito; na vivência religiosa, quando, não raro, católicos, por exemplo, buscam o Compêndio do Catecismo para uma boa consulta; e, pasmem, até na atitude do ladrão que, para roubar sua vítima, costuma submetê-la a xingamentos para, diminuindo-a, amenizar o dilema moral que eventualmente corrói sua própria mente para lhe permitir cometer aquela maldade. São vários, na vida, os exemplos de dilemas morais. Em “As organizações são morais?”, o Adm. Wagner Siqueira sugere que o interesse das empresas, lucro, contamina qualquer tentativa de transformar o respeito ao próximo em um valor moral, vez que este fundamentaria-se no universalismo e no desinteresse. O respeito ao próximo, segundo ele, pertenceria exclusivamente à consciência de cada um e na plenitude da pessoa como um ser moral. Condicionar o grau de respeito ao próximo (cliente) à capacidade de pagamento e perfil de comprador não seria exatamente um ato moral. Na gestão pública, porém, podemos afirmar que o conceito de respeito ao cliente aproxima-se da ideia de respeito ao próximo, vez que a relação entre a Administração Pública e os usuários de seus serviços percebe-se universal e desinteressada, condição fértil para falarmos em valor moral e, consequentemente, dilemas morais. A nefasta experiência com a pandemia trouxe-nos uma série de novas percepções sobre os muitos dilemas morais passíveis de enfrentamento na esfera pública. Não raro os gestores estão precisando tomar decisões que, em outras circunstâncias, poderiam trazer consequências diferentes. Laís Silveira Santos, doutora em Administração, publicou recente artigo na Revista Brasileira de Administração Pública, intitulado “Moral dilemmas of the Brazilian public management in the face of the COVID-19 pandemic”, enumerando seis dilemas enfrentados no Brasil durante a pandemia. Seriam eles: a) isolamento social como medida de prevenção: necessidade, restrição de direitos e/ou responsabilidade cívica/moral? b) Big Data no gerenciamento da pandemia: ‘big brother’ ou ferramenta de gestão? c) Auxílio emergencial: necessidade, burocratização e possibilidade de desvios; d) Liberação de presidiários como medida de contenção da pandemia; e) Suspensão das aulas e atividades educacionais presenciais; f) Profissionais de saúde: honrar a profissão ou proteger a família e a si próprio? Muito além de conflitos de ordem econômica e legal, quase sempre mais claros e objetivos, e políticos (enviesados por interesses eleitorais), as decisões na esfera pública deparam-se sempre com valores morais, dado o caráter coletivo das políticas públicas. Embora supostamente desobrigados de decisões institucionais morais na esfera privada, na área pública o raciocínio moral é obrigatório para gestores. Lideranças públicas devem ser moralmente responsáveis pelas decisões garantidoras de segurança, cidadania, dignidade, educação e saúde, com total respaldo da ciência e respeito à vida. Creio que todos sabem o que precisa ser feito. Não sabem é como serão eleitos depois.
Rodrigo Cavalcante Professor, Mestrando em Administração e Servidor Público Federal
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